Refletindo um pouco a respeito de minhas deficiências intelectuais percebi que faltam em mim conecimentos maiores a respeito de duas áreas de maior importância para quem se proponha a trilhar um caminho na filosofia. Essa concientização poderia se aplicar aos meus interesses específicos mas, se por um lado vejo que muitos outros como eu padecem do mesmo problema, isso pode ser projudicial para a o avanço da filosofia como tal. Se eu estiver correto, isso explica porque hoje em dia muitos autores gostam de passar psicologismos por filosofia sem a menor dor na conciência, conforme diagnostica, por exemplo, Bryan Magee. Peço perdão pelo emprego de uma linguagem nada formal em boa parte do texto, mas a escrita é comandada mais pelo meu humor do que pelo propósito do projeto.
Lendo um pouco da matéria um sujeito moderadamente educado vai inevitavelmente descobrir que a filosofia deve se reportar essencialmente a problemas filosóficos. Em termos claros, o grande barato da filosofia passa longe do ideal do sábio que a tudo responde e consiste na capacidade de olhar para o mundo e propor as perguntas certas.
As perguntas, é claro, podem ter o mais variado conteúdo, desde que (veja que esta é a regra para a grande filsofia) sejam perguntas sobre o mundo. O filósofo de fato, vá aí listando os figurões cuja leitura realmente vale a pena, interpela o mundo para tentar compreendê-lo. Só depois vai interpelar os outros figurões a respeito de suas dúvidas e por fim, se a coisa ficar muito complicada, escarafunchar os escritos dos comentadores mais destacados. No fundo, grande parte do que se escreve sobre filosofia não é filosofia e nem muito menos é interessante. Seguindo essa ordem (com a insistência quase didática sobre o mundo, que sacrifica o estilo que porventura houvesse nesse escrito).
É por isso que quando escrevo sobre qualquer coisa parto de necessidades estritamente pessoais, são meus problemas e isso me torna a pessoa mais indicada para pensar sobre este conjunto específico de problemas e como seus elementos se relacionam; a partir daí a coisa toda ganha algum fôlego e tem alguma chance de virar filosofia se eu teiver a sorte, a habilidade e a dedicação de ficar bom na atividade. Mas esse parágrafo é uma nota de rodapé.
Queria mesmo chegar no começo da filosofia. A disciplina era ligada ao estudo da natureza justamente porque a filosofia e as ciências naturais tem um objeto em comum, a realidade. Isso quer dizer que existe a realidade, e por isso insisto que uma filosofia que negue a realidade por obra de algum idealismo ou solipsismo deve tratar-se de uma não filosofia. A origem comum das ciências naturais e da filosofia vai ainda mais fundo: os grandes problemas que ambas tratam são os mesmos. O que constitui a realidade, do que é feita a matéria, qual é o limite do universo, o que é possível conhecer, e muitas outras perguntas que não me ocorrem no momento mas que seguem o exemplo das precedentes.
Existe um outro lado da filosofia que não diz respeito às ciências naturais: o da a ética e da moral. A filosofia moral e ética (não me detenho com calma no vespeiro que é a distinção entre as duas, se de fato existe), é a que concerne a ação humana. Os problemas desta disciplina não dizem respeito ao mundo diretamente mas sim de uma certa atitude dos homem com relação ao mundo. É de natureza bastante diversa da filosofia natural por dizer respeito mais diretamente ao homem. Nesse campo os valores entram em cena e as perguntas com as quais Sócrates chocou o mundo da filosofia de tal forma que acharam mais fácil convidá-lo a suicidar-se (e é bem sabido que o filósofo aceitou a sugestão): o que é a justiça, o que é o bem, e outras dúvidas do gênero. A natureza mais sutil da matéria em relação a solidez física do objeto dos estudos da natureza é que acabou culminado num danoso relativismo que assombra nossa sociedade milhares de anos após o começo do pensamento filosófico.
Estes dois aspectos da ativdade filosófica estão ligados constitutivamente à disciplina, e infelizmente são negligenciados por uma parte significativa dos estudantes de filosofia. Nesse ponto é que meu problema pessoal aparece: não possuo uma formação satisfatória nas duas disciplinas que me habilitariam a fazer perguntas mais pertinentes a respeito destes dois aspectos da filosofia, a saber, a física e a teologia.
A teologia é o estudo da mais maravilhosa empresa intelectual de explicação do universo em cada pormenor. Partindo, mais uma vez, do ponto de vista pessoal, falo do cristianismo. A busca por Deus revela uma formidável sensibilidade para questões de cunho moral. Essa sensibilidade é tão grande que, ao considerarmos o fracasso das sucessivas tentativas filosóficas de fundamentar a moral sem apelar para a religião, não pode mesmo ter sido obra humana. A partir da teologia pode-se formular todo o tipo de pergunta sobre o homem no seu íntimo mais escondido e, com alguma atenção, receber respostas bastante satisfatórias. As respostas interessam aos crentes. As perguntas respondidas interessam a todas as pessoas, ou ao menos deveriam interessar.
A física marca a filosofia porque os problemas que ela encontra vão parar, mais cedo ou mais tarde, nas mãos dos filósofos. Com os problemas da física é que a grande filosofia foi construída e com as revoluções na física é que surgiram as revoluções filosóficas verdadeiramente dignas de nota (exemplos gritantes deste fato são as filosofias de Aristóteles e de Kant).
Por essas razões é que me parece que uma carência de conhecimento nesses campos seja uma grande pedra no caminho da compreensão da filosofia a partir de problemas reais e atuais, conforme creio ser o modo correto de entender a matéria. O problema de se ignorar estas fontes de problemas filosóficos é que corta-se a raiz que alimenta a filosofia e de modo a torná-la estéril.
quinta-feira, novembro 17, 2005
terça-feira, novembro 08, 2005
Schopenhauer e o Cristianismo
Minhas incursões pela filosofia do sexo e da morte de Schopenhauer tem sido uma influência grande demais no que escrevo para não começar a incomodar. Todavia é irresistível a tentação de escrever desse modo, uma vez que é uma filosofia que atiça a paixão, fala à sensibilidade, parece ter a dor como tema central, e é no mais bastante intensa em repercussões artísticas de valor indiscutível, a exemplo de Machado de Assis e Richard Wagner e suas respectivas obras.
Essa filosofia é uma filosofia da morte. A negação e única saída para o sofrimento é o fim da vontade de viver. As consequências dessa busca são irremediavelmente a morte ou a mortificação do corpo, que é uma morte em vida. É uma filosofia que nega o mundo para salvá-lo. É paradoxal e contraditória em um único ponto, que é justamente o seu ponto central, sua ética e ao mesmo tempo sua escatologia.
O impulso sexual que deriva da afirmação da vontade de viver e que tantas mudanças causou enquanto idéia no mundo, via Freud (o qual não deixa de dar a Schopenhauer o devido crédito), se faz sentir na minha própria carne, sem apêlo e sem perdão. Se me inclino a ele, nos termos desta filosofia, o faço porque negá-lo seria uma mortificação e eu, sem me importar com o alegado caráter ilusório da vida, quero mais vida a todo o instante.
Mas essa filosofia não esgota o mundo. Não existe nada pior do que começar a explicar seu pensamento com base numa obra filosófica isolada, muito menos uma de consequências tão devastadoras quanto esta. Procuro, nos momentos em que não estou chafurdando nas torrentes irresistíveis da vontade da carne, nesse infindável ato de Tristão e Isolda que é o mundo por elas compreendido, procuro aproximar-me do conhecimento de Deus.
É justamente esse que me parece mais fugidio. O conhecimento está escrito e é fácilmente encontrado em diversas línguas na Bíblia Sagrada. No entanto, embora expresso e público, o conhecimento de Deus é elusivo porque é o único que não exige somente dotação intelectual, mas um ato (voltando ao discurso que ha pouco criticava) de vontade que por sua vez exige a negação da vontade mesma, dessa vez não para a morte, mas para a vida.
Em Cristo o fiel nega a própria vontade e mortifica-a para que a vontade de Cristo se realize nele. Como disse o apóstolo Paulo, não importa que eu viva, mas que Cristo vive em mim. Essa submissão à vontade de Deus, infinitamente maior do que a nossa, é uma negação da liberdade de realizar a vontade para poder ganhar a liberdade das cadeias da própria vontade conforme a entendemos já à luz da Bíblia enquanto vontade da carne.
A filosofia de Schopenhauer, ao negar a Cristo e a Deus categoricamente, nasce já uma filosofia limitada a entender o homem enquanto pecador e perdido e o mundo como o reino do maligno. Tanto que para Schopenhauer o nascimento e transformação dos santos é incompreensível. Não admira que não pudesse entender o que torna um homem santo, uma vez que jamais deixou de entender o homem como limitado à determinação da vontade carnal e assim o entendeu de forma tão extrema que a elevou a idéia constitutiva e ordenadora do mundo todo. Essa posição, vista da concepção mais ampla que é fornecida pelas escrituras e pela fé, parece agora risível, uma vez que o mundo só é sofrimento e vontade quando se é escravo do pecado.
Dessa compreensão resta pensar no problema fundamental que é escolher entre o sofrimento Schopenhaueriano e a morte e renascimento em Cristo. Por mais torturante que seja o sofrimento constante, a escolha por Cristo é mais difícil porque não partimos dela, devemos buscá-la, e mais, buscá-la de coração, e ainda, buscá-la enquanto é tempo. Qualquer pessoa tão determinada, dado que esteja consciente das implicações de sua escolha, possui dentro de si um poder imenso. Espero que eu encontre as forças de empreender a busca, não pela compreensão destas coisas, mas pela vontade de abraçá-las por inteiro, conforme o caminho que resolva tomar por fim.
Essa filosofia é uma filosofia da morte. A negação e única saída para o sofrimento é o fim da vontade de viver. As consequências dessa busca são irremediavelmente a morte ou a mortificação do corpo, que é uma morte em vida. É uma filosofia que nega o mundo para salvá-lo. É paradoxal e contraditória em um único ponto, que é justamente o seu ponto central, sua ética e ao mesmo tempo sua escatologia.
O impulso sexual que deriva da afirmação da vontade de viver e que tantas mudanças causou enquanto idéia no mundo, via Freud (o qual não deixa de dar a Schopenhauer o devido crédito), se faz sentir na minha própria carne, sem apêlo e sem perdão. Se me inclino a ele, nos termos desta filosofia, o faço porque negá-lo seria uma mortificação e eu, sem me importar com o alegado caráter ilusório da vida, quero mais vida a todo o instante.
Mas essa filosofia não esgota o mundo. Não existe nada pior do que começar a explicar seu pensamento com base numa obra filosófica isolada, muito menos uma de consequências tão devastadoras quanto esta. Procuro, nos momentos em que não estou chafurdando nas torrentes irresistíveis da vontade da carne, nesse infindável ato de Tristão e Isolda que é o mundo por elas compreendido, procuro aproximar-me do conhecimento de Deus.
É justamente esse que me parece mais fugidio. O conhecimento está escrito e é fácilmente encontrado em diversas línguas na Bíblia Sagrada. No entanto, embora expresso e público, o conhecimento de Deus é elusivo porque é o único que não exige somente dotação intelectual, mas um ato (voltando ao discurso que ha pouco criticava) de vontade que por sua vez exige a negação da vontade mesma, dessa vez não para a morte, mas para a vida.
Em Cristo o fiel nega a própria vontade e mortifica-a para que a vontade de Cristo se realize nele. Como disse o apóstolo Paulo, não importa que eu viva, mas que Cristo vive em mim. Essa submissão à vontade de Deus, infinitamente maior do que a nossa, é uma negação da liberdade de realizar a vontade para poder ganhar a liberdade das cadeias da própria vontade conforme a entendemos já à luz da Bíblia enquanto vontade da carne.
A filosofia de Schopenhauer, ao negar a Cristo e a Deus categoricamente, nasce já uma filosofia limitada a entender o homem enquanto pecador e perdido e o mundo como o reino do maligno. Tanto que para Schopenhauer o nascimento e transformação dos santos é incompreensível. Não admira que não pudesse entender o que torna um homem santo, uma vez que jamais deixou de entender o homem como limitado à determinação da vontade carnal e assim o entendeu de forma tão extrema que a elevou a idéia constitutiva e ordenadora do mundo todo. Essa posição, vista da concepção mais ampla que é fornecida pelas escrituras e pela fé, parece agora risível, uma vez que o mundo só é sofrimento e vontade quando se é escravo do pecado.
Dessa compreensão resta pensar no problema fundamental que é escolher entre o sofrimento Schopenhaueriano e a morte e renascimento em Cristo. Por mais torturante que seja o sofrimento constante, a escolha por Cristo é mais difícil porque não partimos dela, devemos buscá-la, e mais, buscá-la de coração, e ainda, buscá-la enquanto é tempo. Qualquer pessoa tão determinada, dado que esteja consciente das implicações de sua escolha, possui dentro de si um poder imenso. Espero que eu encontre as forças de empreender a busca, não pela compreensão destas coisas, mas pela vontade de abraçá-las por inteiro, conforme o caminho que resolva tomar por fim.
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