I
Enquanto não me chega a paciência ou a energia para reler e acabar os posts que queria ter publicado aqui vou escrevendo sobre outras coisas que me ocorrem. O tom de "querido diário" é inevitável, mas já era hora de começar a escrever em maior quantidade, o que é melhor do que não escrever at all. Na era do Twitter (tremo diante da idéia de haver uma "era" do Twitter) em que podemos escrever telegráficos relatos de nossas atividades para todas as pessoas que nos acompanham pela internet, eu, o prolixo bacharel, prefiro utilizar a tecnologia para informar a quem interessar que estou ouvindo Mozart no momento, enquanto me recuperode uma gripe desagradável (putz, e existe outro tipo?) cuja força descomunal me desancou ontem e hoje deixou somente uma má lembrança e muitos lenços de papel.
II
Instalei em meu notebook um programa chamado Digsby, que unifica as mensagens de diversas contas de e-mail, perfis em sites de relacionamento e programas de chat pela internet. Embora esteja gostando da ferramenta, pois me poupa o tempo de ficar ciscando informações e mensagens recebidas de diversas fontes e com diversos graus de interesse.O que me assustou foi constatar, depois de configurar o programa para administrar o MSN, Facebook, Yahoo Mail, Gmail, Hotmail, Google Talk e Twitter (o programa não se conecta ao Orkut nem ao Skype, os quais tenho que ver separadamente) , a quantidade de meios de comunicação dos quais disponho. Achei um exagero, e não fosse pelo Digsby acho que já teria exterminado boa parte deles, pois nunca gostei de estar tão acessível assim. Sinal dos tempos. Moro longe da família e dos amigos mais antigos e seria mais difícil não fossem estas pequenas comodidades, mas para que tantas? Noventa e cinco por cento do que recebo é bobagem. Outro sinal dos tempos. O marketing agressivo é um adversário feroz do nosso controle sobre o próprio tempo (é também, acredito, o túmulo da elegância, da lisura e do respeito) e ficamos constantemente a defender-nos de uma quantidade indescritível de bobagens as quais nos esfregam à cara.
Quantas coisas eu mesmo tive de esquecer ou mutilar para desempenhar meu próprio trabalho... Sempre tive por hábito falar quando solicitado, jamais ser insistente com qualquer pedido, tratar os mais velhos com a devida deferência, e fui sistematicamente solicitado a passar por cima de anos de um trabalho árduo de educação para vender Starbucks e assim "defendê o leite das criança". Situação incômoda, embora eu também não tenha por costume reclamar de barriga cheia. O trabalho é em si fácil. Só não consigo integrá-lo a minha personalidade. Talvez seja isso que me deprime periodicamente. No trabalho também interajo com um número enorme de pessoas por um tempo muito curto. É uma ocupação bastante dispersiva e volto para casa sem um pingo de energia. Ora, "quem comigo não ajunta espalha", e eu estou em cacos, espalhado dessa maneira. Peço a Deus a gentileza de, novamente, juntá-los e ordená-los como só Ele sabe. Não é um problema fundamentalmente diferente destes diversos instrumentos de comunicação que solicitam minha atenção. Doença moderna, criada pelo homem mesmo, com a melhor das intenções.
sexta-feira, novembro 20, 2009
segunda-feira, novembro 09, 2009
Encontro de Olavo de Carvalho, Alan Keyes e Alejandro Peña Esclusa
Assistam o vídeo, registro de um encontro entre três homens que têm, cada qual em sua área, pensado a política com responsabilidade intelectual e integridade pessoal.
segunda-feira, novembro 02, 2009
Engraçadinha e o Futebol
Curioso como certas coisas voltam à memória com uma força extraordinária, malgrado o decurso dos anos, e nos devolvem um pouco do que somos e já nem sabíamos mais.
O episódio recente, mais ou menos recente, teve a ver com o gosto que minha senhora insiste em manter pela teledramaturgia da Rede Globo. Ora, eu já fui, até pouco tempo atrás, um desses babaquinhas que achavam muito inteligente criticar a emissora. Primeiro criticava por ser direitista demais, depois descbri que não existia direita de verdade no Brasil e passei a criticá-la pelo motivo contrário. Hoje acho muito besta ficar analisando umas tantas puerilidades televisivas e "jornalísticas" do momento e me ocupo de analisar coisas mais interessantes, e vou de quando em quando umas tantas risadas ao lado da patroa assistindo TV em portugûes quando temos a chance, sem culpa nem arrependimento.
But, alas, I digress. O caso é que nessas ocasiões de convívio com minha adorável consorte, calhou de botarmos as mãos naquela curiosa minissérie que foi a Engraçadinha. Vejam bem, quando a série saiu, eu não pude assistir. Mamãe não me deixava por que o negócio era muito maduro para meus verdes olhos (o que não é dizer que meus olhos sejam verdes, como de fato não são), vovó dizia que era imoral, era pecado. Papai bem poderia ter dito que a coisa toda era uma bela putaria (termo dele, não meu) e que eu ganhava mais indo ler um livro.
Bom, pensei, por um lado terei carta branca para ver umas peladas na TV, por outro vou ter que agir muito sério e compenetrado. Não consegui me compenetrar, nem fingir seriedade. O melhor que pude fazer foi passar uns comentários de conteúdo profundamente moralista num tom incofundivelmente histriônico.
No fim das contas eu gostei da série, não pelos motivos óbvios, que já não sou mais moleque, mas porque a linguagem era deliciosa (e vejam que nem li o livro, mas parece se tratar de uma imitação bacana do estilo do autor), e pela trama, que era chocante e fascinante ao mesmo tempo. E ainda tinha o bestiário de imorais que o programa perfilava, me divertiu à beça ver a interação daqueles tipos humanos tão marcados, cada qual vestindo, falando, transpirando, seus pecados particulares.
Ao final da jornada, três pensamentos me assaltaram, mais um pensamento e seria uma quadrilha (ou bando). Aliás, alguém lembra qual foi a última vez em que foi assaltado por um pensamento? Inversamente, não passou por minha cabeça pensamento algum na única vez em que fui assaltado de verdade. Pois então, fui metaforicamente assaltado por três pensamentos, o primeiro foi que eu precisava logo ler mais alguma coisa do Nelson Rodrigues. O segundo foi que se eu tivesse lido Nelson Rodrigues, lá nos tempos de ginásio, teria me poupado a leitura de John Irving, que hoje não acho nem de longe tão interessante quanto o cronista pátrio. O terceiro, logo depois do segundo (naturalmente), foi que eu tinha sim lido Nelson Rodrigues, e tinha gostado.
Se tinha lido e tinha gostado, por que esquecera? O mistério de minha memória roubada (quem sabe por um pensamento assaltante?) me incomodou durante algum tempo. Foi então, algum tempo mais tarde, recém recuperado da bebedeira que seguiu a última vitória da seleção de Dunga sobre a Argentina de ninguém mais ninguém menos que Don Diego Maradona, lembrando de outros assuntos futebolísticos (na distante Dallas em que football é sinonimo de Cowboys, e da vida amorosa de Tony Romo) descobri a razão do esquecimento: Nelson Rodrigues me fez gostar de futebol.
Explico. Meu pai, professor de Educação Física, preparador físico e paisagista nas horas vagas, fez o possível para me interessar pela arte da bola, sem grande sucesso. Por acaso caiu-lhe nas mãos uma edição d'A Sombra das Chuteiras Imortais, a qual tomei emprestada e devorei com alegria. De repente o futebol pareceu interessante, não na tela da TV, ao som dos berros do Galvão Bueno, ou como o exercício suado das aulas ao sol das três da tarde; antes aparecia como o embate luminoso de heróis da bola de outras épocas. Passei a ver o esporte com outros olhos, projetado na tela imaginária que fazia as partidas muito mais reais que aquelas que acompanhava pela televisão.
Quando recordo as discussões sobre quem jogava melhor, os jogadores de antigamente ou os atuais, outra cretinice da qual me curei (menos uma entre muitas), vejo que o buraco é mais em baixo: os escritores daquela época eram melhores, os jogadores assumiam uma estatura e dignidade assustadoras por tabela.
Tudo isso para dizer que estou gostando muito de ler Nelson Rodrigues e como este feliz (re)encontro veio a se passar. E quem quiser que conte outra.
O episódio recente, mais ou menos recente, teve a ver com o gosto que minha senhora insiste em manter pela teledramaturgia da Rede Globo. Ora, eu já fui, até pouco tempo atrás, um desses babaquinhas que achavam muito inteligente criticar a emissora. Primeiro criticava por ser direitista demais, depois descbri que não existia direita de verdade no Brasil e passei a criticá-la pelo motivo contrário. Hoje acho muito besta ficar analisando umas tantas puerilidades televisivas e "jornalísticas" do momento e me ocupo de analisar coisas mais interessantes, e vou de quando em quando umas tantas risadas ao lado da patroa assistindo TV em portugûes quando temos a chance, sem culpa nem arrependimento.
But, alas, I digress. O caso é que nessas ocasiões de convívio com minha adorável consorte, calhou de botarmos as mãos naquela curiosa minissérie que foi a Engraçadinha. Vejam bem, quando a série saiu, eu não pude assistir. Mamãe não me deixava por que o negócio era muito maduro para meus verdes olhos (o que não é dizer que meus olhos sejam verdes, como de fato não são), vovó dizia que era imoral, era pecado. Papai bem poderia ter dito que a coisa toda era uma bela putaria (termo dele, não meu) e que eu ganhava mais indo ler um livro.
Bom, pensei, por um lado terei carta branca para ver umas peladas na TV, por outro vou ter que agir muito sério e compenetrado. Não consegui me compenetrar, nem fingir seriedade. O melhor que pude fazer foi passar uns comentários de conteúdo profundamente moralista num tom incofundivelmente histriônico.
No fim das contas eu gostei da série, não pelos motivos óbvios, que já não sou mais moleque, mas porque a linguagem era deliciosa (e vejam que nem li o livro, mas parece se tratar de uma imitação bacana do estilo do autor), e pela trama, que era chocante e fascinante ao mesmo tempo. E ainda tinha o bestiário de imorais que o programa perfilava, me divertiu à beça ver a interação daqueles tipos humanos tão marcados, cada qual vestindo, falando, transpirando, seus pecados particulares.
Ao final da jornada, três pensamentos me assaltaram, mais um pensamento e seria uma quadrilha (ou bando). Aliás, alguém lembra qual foi a última vez em que foi assaltado por um pensamento? Inversamente, não passou por minha cabeça pensamento algum na única vez em que fui assaltado de verdade. Pois então, fui metaforicamente assaltado por três pensamentos, o primeiro foi que eu precisava logo ler mais alguma coisa do Nelson Rodrigues. O segundo foi que se eu tivesse lido Nelson Rodrigues, lá nos tempos de ginásio, teria me poupado a leitura de John Irving, que hoje não acho nem de longe tão interessante quanto o cronista pátrio. O terceiro, logo depois do segundo (naturalmente), foi que eu tinha sim lido Nelson Rodrigues, e tinha gostado.
Se tinha lido e tinha gostado, por que esquecera? O mistério de minha memória roubada (quem sabe por um pensamento assaltante?) me incomodou durante algum tempo. Foi então, algum tempo mais tarde, recém recuperado da bebedeira que seguiu a última vitória da seleção de Dunga sobre a Argentina de ninguém mais ninguém menos que Don Diego Maradona, lembrando de outros assuntos futebolísticos (na distante Dallas em que football é sinonimo de Cowboys, e da vida amorosa de Tony Romo) descobri a razão do esquecimento: Nelson Rodrigues me fez gostar de futebol.
Explico. Meu pai, professor de Educação Física, preparador físico e paisagista nas horas vagas, fez o possível para me interessar pela arte da bola, sem grande sucesso. Por acaso caiu-lhe nas mãos uma edição d'A Sombra das Chuteiras Imortais, a qual tomei emprestada e devorei com alegria. De repente o futebol pareceu interessante, não na tela da TV, ao som dos berros do Galvão Bueno, ou como o exercício suado das aulas ao sol das três da tarde; antes aparecia como o embate luminoso de heróis da bola de outras épocas. Passei a ver o esporte com outros olhos, projetado na tela imaginária que fazia as partidas muito mais reais que aquelas que acompanhava pela televisão.
Quando recordo as discussões sobre quem jogava melhor, os jogadores de antigamente ou os atuais, outra cretinice da qual me curei (menos uma entre muitas), vejo que o buraco é mais em baixo: os escritores daquela época eram melhores, os jogadores assumiam uma estatura e dignidade assustadoras por tabela.
Tudo isso para dizer que estou gostando muito de ler Nelson Rodrigues e como este feliz (re)encontro veio a se passar. E quem quiser que conte outra.
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