A melhor prosa é aquela que se pretende poesia. Ela flui da pena como que por milagre, sem o menor receio de não ser clara, embora seja, de não ser útil, embora seja, de não ser nada, enquanto trata de tudo que nos concerne enquanto humanos, pois como ela temos necessidade de poesia.
Essa prosa canta o amor como quem ama, sem floreios inúteis mas com a pretensão de se fazer bela para receber o amor. A prosa que ama não é nunca só por ter quem leia suas linhas em adoração extática e, sem poder agüentar dentro de si tanto sentimento, suspira.
A prosa que quer ser poesia é como o homem que senta em seu banco ao cair da tarde, acende um cigarro, olha para o mar e, ao ver a mulher que bem sabe que vai amar para o resto de sua vida, deseja ser o mar para abraçá-la. Esse suspiro entre a calma e o desejo é fundamental. É o exato momento em que a poesia nasce. Mas assim como o homem não é mar, logo a poesia percebe que será meramente prosa, com essa doce memória do que poderia ter sido. Enquanto o homem será a partir dali a sombra do que poderia ter sido se tivesse de fato amado a mulher logo após o suspiro.
A prosa que se pretende poesia, pretende ter sido poesia, mas não pretende mudar. O desejo de algo que não se foi, a única escolha que não se fez, é o que acomete a melhor prosa. Do mesmo modo acomete o homem, que sabe de sua natureza tola, delicada diante do mundo quando, na verdade, queria ser dele senhor. E o homem, como a prosa que faz, sente o desejo de poesia.
A beleza e o poder são as coisas mais impressionantes que podemos perceber. Não há quem não os sinta. Por essa razão a poesia nos é tão cara. Ela sintetiza o que nos toca, bela e fugaz, poderosa ao mesmo tempo que frágil, cálida e álgida conforme nossos próprios corações e mentes.
Proseio porque a poesia que possuo não tem palavras para se expressar. E eu, pobre de mim, não posso emprestar-lhe as minhas. O meu desejo de poesia é uma constante necessidade metafísica do belo. Como ela me escapa, busco ter, de beleza em minha vida, uma mulher. Como ela me escapa, sinto então novamente um desejo de poesia.
E eu mesmo permaneço prosa. Uma longa crônica de meus feitos pífios, das pegadas que deixo na areia do tempo. Sou como o homem que acende um cigarro, senta no banco e olha o tempo escorrer por entre os dedos, e a vida escorrer por entre os dedos, sem nem tentar fechar a mão. A vida passa, e por fim suprimos o desejo. Temos em nossa morte uma primeira e última poesia triste.
sábado, dezembro 11, 2004
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