domingo, maio 01, 2005

Vigília

Os dias mais negros da vida são sempre precedidos por momentos de alegria e despreocupação. É daí que vem a recomendação bíblica: sede sóbreos e vigiai. O estado de vigília é condição para sobreviver, seja no mundo dos vivos, da luz e do dia, seja no mundo sutil no qual a alma habita lado a lado com os mistérios.

Hoje o mundo dá suas voltas conectado por cabos, circundado por satélites, iluminado, ponta a ponta, pelo conhecimento humano e pelas obras homens. Nossas mãos dão nova forma a variados cantos da terra, e cada vez mais, enquanto nos fascinamos com as obras de nossas mãos, enquanto cada vez mais aspiramos tomar o trono de Deus e anunciamos sua morte ou negamos que sequer tenha tido existência, deixamos para trás a beleza e a importância dos mundos sutis. O nosso tempo padece e os problemas que se tenta combater não passam de sintomas. O espírito humano é que está doente, cego pelo poder das mãos, obscurecido pela técnica e em busca de absolvição fácil por seus vícios mais profundos.

Talvez o sinal mais claro de que estamos lançados nas mãos do determinismo sinistro da escravidão pelo desejo seja o extremo relativismo moral, religioso, ético e filosófico reinante. Não é possível dizer em voz alta que existe um bem e um mal, um certo e um errado, um justo e um injusto, a despeito das opiniões humanas que só fazem mudar sem ser chamado de fundamentalista, ou de intolerante.

Posso estar enganado, mas costumava-se ter aspirações mais altas do que a mera vontade de ser tolerante e políticamente correto. Os princípios perenes são ridicularizados por nossa geração corrupta para que possamos conviver com nossa própria corrupção. É um processo de aniquilação da consciência.

Essa corrupção é uma doença espiritual. E nesse tempo em que a doença é mais grave, tanto mais os sintomas dos quais o mundo padece são diagnosticados a partir da negação do espírito que é deixado para sofrer ainda mais. Esquecemos do tempo em que podíamos transitar por entre nossas consciências perguntando o que era certo e tínhamos a liberdade de fazer o errado. Hoje em dia não há pecado, tudo o que você tiver vontade de fazer é certo. E depois todos se espantam com a fragilidade dos sistemas de argumentação moral e com as barbaridades cometidas sem motivo aparente.

Esse mundo precisa de Deus desesperadamente e só faz negá-lo. O homem precisa salvar a sua alma para só então encontrar paz e graça. A alternativa é ser escravo do desejo, é negar a própria liberdade sem nem ao menos admitir que há escolha. Não vigiamos mais. Agimos como se não houvesse amanhã, nem juízo. Que Deus tenha piedade de nós.

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