sexta-feira, maio 20, 2005

Despedida

Tenho a meu lado, no leito,
a morte, que me vigia.
Pois de tanto amar a vida,
por ela fui desprezado;
e tenho a morte ao meu lado
a despeito da porfia
de fugir ao meu destino
de ser por ela encontrado.
A morte já me sabia
a morte já me esperava.

Se a vida foi vazia,
se o sentido foi disperso,
se só deixei o meu verso
testemunha da passagem
pela vida que me enjeita,
já não cabe discutir.

Não importa que a viagem
seja feita de repente,
a minha filosofia
é morrer serenamente,
sem ninguém me ver partir.

Estou certo desse tanto:
de que ao longo dessa sina
de ter vivido e morrido
(sina de todo rebento
desde cada nascimento)
eu amei, chorei um dia,
e creio que fui amado
ao menos por um momento.

Então vou sem sofrimento,
sem pesares me disperso.
Minha despedida em verso
é fruto de uma ironia:
que tanto amasse a poesia
e só prosa me aprouvesse
na minha biografia.

Nenhum comentário: