Como alguns podem ter notado, desde que descobri, a pouco mais de quatro meses, que é possível que alguma pessoa além de mim mesmo se interesse por mim, tornei-me um romântico nojento. Esse texto é mais um da série, espero que faça algum sentido, se não fizer, removo o post. É que fica mais fácil julgar o raio do texto depois de publicado. Dedico, é claro, à minha namorada, cuja ausência me levou a falar sobre o amor mais uma vez.
Aí vai:
A Costela
Quando nos relacionamos com outras pessoas romanticamente, e é bastante comum que isso aconteça hoje em dia, nos relacionamos porque obviamente procuramos na tal pessoa algo que nos falta. Gosto de pensar que os homens andam sempre à caça daquela costela que lhe tiraram nos últimos dias da criação e que para reavê-la acabam por ter de levar uma mulher inteira. Essa não deixa de ser uma perspectiva interessante, e é sempre mais fácil entender as coisas por meio das histórias que aprendemos desde a infância (alguém poderia dizer que tem a ver com o papel do mito na sociedade, algo no estilo de Joseph Campbell, mas eu prefiro chamar de histórias, como algo que aconteceu muito tempo atrás). È também mais verdadeiro e cheio de sentido, não externo, mas interno; faz mais sentido para mim, e isso importa muito, já que posso relegar para momentos menos íntimos do que este, o cuidado com a objetividade.
Pois saí eu à caça de minha costela perdida, tendo por questão de honra a tarefa de recupera-la, mesmo que estivesse irremediavelmente ligada a uma mulher inteira. A busca pela mulher que caminha por aí com a nossa costela é algo que pode levar a vida toda. Fazendo um estudo de biografia comparada, a minha com a dos outros, e percebendo o quanto os homens são estúpidos, fico mais e mais surpreso ao notar que menos e menos gente se sente preparada para sair em busca da tal costela, meio que numa tentativa de adiar o resto de suas vidas.
Os métodos para empreender a grande busca são os mais diversos. Ao longo da história, homens já se insinuaram para mulheres nas mais diversas situações, com resultados discutíveis e variados graus de sucesso a depender do homem e do método empregado.
Nunca fui um predador da noite, do tipo que saía a procurar vítimas entre as nada inocentes mulheres que estivessem por aí e em função de algum motivo me chamassem a atenção, no entanto parece ser isso que todo mundo está fazendo. Engraçado notar que a maioria das pessoas não é muito seletiva, em especial se estiver com os sentidos entorpecidos por uma razão ou por outra. Eu tentava, na verdade, iniciar uma conversação com uma garota que me chamasse a atenção. Pode parecer uma bobagem, mas é que em certo ponto da vida (alguns chegam nesse ponto mais cedo do que outros) você se cansa de se divertir com as mulheres erradas e começa a procurar por alguém com quem conversar e em última intância, tomar o café da manhã e ler o jornal, ou alguma coisa assim.
O curioso é que justamente quando você não tem a menor intenção de fazê-lo você se apaixona. Não sou um desses chatos que fica enaltecendo o verdadeiro amor e falando que a paixão é passageira. Paixão, normalmente, é uma tremenda viagem. Você perde noção de certo e errado, esquece que um dia teve um cérebro, acredita que vai amar para sempre e que o mundo acaba amanhã. É gostoso, não faz mal se administrada em pequenas doses e ainda por cima há uma boa chance de se conseguir alguma diversão no processo. Você, nesse momento, não imagina, mas podem acontecer duas coisas: você pode estar certo ou pode estar redondamente enganado.
Em primeiro lugar, existe sim a possibilidade de você ter encontrado o amor da sua vida e ainda por cima estar apaixonado por ela. A expressão é batida, é brega, mas faz o serviço. Uma hipótese rara o bastante, admito, mas há precedentes. Não se sabe bem ao certo o porquê, mas certas pessoas acham umas nas outras o suficiente para que queiram passar o resto da vida juntos.
A maioria dos jovens não está calejada o bastante para reconhecer isso. Eu mesmo muitas vezes fico pensando se minha capacidade de julgamento é tão boa assim (no fundo acredito que sim, minha capacidade de julgamento é tão boa quanto imagino, mas já vi gente mais inteligente se enganar). O jovem sensualista ao extremo não consegue reconhecer ou, quando reconhece, dar o valor devido à gema rara que surge diante de si. Alguns mais velhos tem o mesmo problema, mas deve ser uma daquelas conseqüências do amadurecimento tardio que tem se tornado tão comum. O grande interesse, no geral, acaba sendo justamente a rotatividade de prazeres; a insatisfação constante nos impele de pessoa em pessoa, usando e sendo usados (sim, já escutei essa pelo menos uma vez, tive de concordar com a autora da frase) de modo que conhecer a pessoa que te completa pode ser um desperdício se você não está pronto. Pouca gente consegue ser otimista a ponto de encontrar o ser amado e ficar a seu lado como seria melhor.
A coisa ruim que pode acontecer é estarmos enganados. Toda a empolgação da paixão pode ter sido fundada sobre o nada. Acabada a mágica que nos fazia pensar que a história chegara ao fim e a busca estava completa, ficamos nós, parados, levando chuva no rosto numa estação de trem vazia com uma expressão estúpida, como o herói de Casablanca. Como dizia o poeta “quando o amor acaba, fica a realidade” (não me recordo quem é o autor da frase, mas serão bem vindos esclarecimentos a respeito).
Muita gente tem dificuldade em admitir que as coisas podem dar errado quando estão apaixonadas. Esse é outro problema comum. O casal pode ser completamente incompatível, não ter nada que os ligue a não ser aquela química fugaz, ou o medo da solidão, ou ainda alguma outra coisa mais sutil do que minha cabeça possa expressar em palavras. O que fazer? Os amigos provavelmente já sabiam, alguém pode ter tentado avisar, quem sabe? O momento em que a paixão acaba é aquele em que nasce a tristeza, a dor, a desilusão. Esses males do amor que nasce morto são as principais razões que qualquer um tem para não tentar de novo. Não os culpo, nos dias de hoje ninguém realmente precisa de mais estresse emocional.
O que resta a ponderar é a questão: por que continuar procurando a tal costela se tudo pode dar errado e tudo o que pode dar errado muito provavelmente vai dar errado. Enquanto olho para a vida agora, estou plenamente consciente disso tudo. Sei que posso estar enganado, como de fato estive todas as vezes até agora. Não obstante, há algo de diferente sobre a vida vivida e a vida contada, parece que há algo de novo que a experiência vivida na hora em que acontece faz aflorar e que não me deixa desesperar. Eu posso até me condenar por talvez ter duvidado, mas continuo insistindo, por fim, na crença de que há amor e de que as coisas podem, inclusive, dar certo. Munido desse otimismo vacilante, procuro entender como pessoas tão diferentes podem acabar unidas pelas circunstâncias e quem sabe encontrar uma na outra o que estiveram procurando. Descubro que não há nenhum bom motivo para isso, mas que o fato de estarem juntos é a única e suficiente prova de que o amor, esse amor sim realista, ciente de sua posição frágil num mundo que tenta os amantes a todo o instante, ou que os encoraja a desistir pode ter de fato acontecido.
Posso dizer que, salvo engano, estou reintegrado na posse de minha costela perdida. O que espero é pouco e ao mesmo tempo muito, jamais voltar a perde-la. Se o amor é um sentimento, basta que se sinta para que ele exista. Se o que sentimos é amor, basta que o tempo prove. O que o futuro reserva eu não sei, mas vou apostar no amor.
domingo, julho 24, 2005
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