Em termos de música existem três acontecimentos que foram essenciais em minha vida. Não fosse por eles eu certamente não seria o mesmo. Os três foram, em ordem cronológica, O Concierto de Aranjuez de Rodrigo, Kind of Blue de Miles Davis e finalmente a mais recente adição ao panteão: Time Out, do Dave Brubeck Quartet.
Imagine um garoto interiorano, caipira mesmo, com uma grande paixão por piano e objetivo muito claro na vida: crescer para virar vaqueiro. Dave iria cuidar da fazenda do pai e criar gado, até que um dia recebeu sua convocação para participar do esforço norte-americano de guerra contra o nazismo. Para a sorte dele, e para a minha, anos depois, a missão que recebeu foi participar de uma banda de jazz que iria entreter as tropas durante a campanha.
Gosto bastante dessa história, não só por que conheço bem o que passa pela cabeça de um garoto caipira (como só um garoto caipira podera conhecer), como me agrada a leveza com que o pianista Dave Brubeck a conta, o sorriso no rosto, a mesma leveza com a qual ele interpreta suas músicas.
A música de Brubeck soa extremamente moderna, para mim ao menos. Parece o tipo de música que as pessoas iriam ouvir no futuro, com seus ritmos sempre mudando e surpreendendo, com belas melodias, sem drama, sem dor, sem raiva... Ouço a música sentindo uma certa nostalgia de um tempo que não foi o meu. Mas parece perfeitamente natural para mim empreender essa viagem, afinal me sinto constantemente preso a esse tempo que não é o meu. A velocidade das mudanças, a falta de limites de cada geração que chega, a falta de... elegância, de ritmo (ou de swing, como queira), são males da era atual aos quais não vou nunca me acostumar. Isso e a comida de microondas.
Sempre ouço dos amigos que falo de modo um pouco anacrônico, como quem lê um discurso. Falo mais ou menos como escrevo, o que sempre parece estranho, especialmente em ocasiões que não pedem nada desse formalismo. Em qualquer ocasião acabo fazendo isso porque sempre me parece a maneira de tornar mais claro o sentido que pretendo transmitir. É justamente este atributo que transborda na música de Brubeck: clareza. Ela soa límpida, complexa e ainda sim agradável, inteligente, como deveriam ser todas as idéias, não só as musicais.
Time Out é uma album pouco usual dentro do jazz de sua época, foi lançado em 1959, pelas escolhas de ritmo feitas pelo quarteto para suas músicas. Somos constantemente surpreendidos pela mudança de ritmo, porém nem de longe somos tomados por confusão ou desnorteamento (o que é muito comum na música contemporânea de cunho vanguardista), o ritmo cambiante parece perfeitamente natural quando executado por mãos tão hábeis. Bem antes das incompreensíveis revoluções do free jazz, enquanto Miles Davis ainda fazia seu delicioso cool interpretando baladas românticas, Dave Brubeck e seu quarteto mostravam algo novo, inusitado e surpreendentemente criaram ao mesmo tempo um album clássico e popular.
Em todas as formas de arte essa é uma combinação rara. A inspiração nem sempre obedece à percepção do que o público esteja pronto para ouvir. Tal confluência só adiciona mais sabor à mistura ritmica e melódica que faz desse um disco tão gostoso de ouvir e ao mesmo tempo tão desafiador enquanto ideal artístico.
Agora algumas considerações de natureza diversa.
A importância de Time Out no plano pessoal se traduz no fato de que, como idéia, compreendi algo do album e tentei não só traduzir em palavras o que percebi, mas também assimilei muito do que escutei num nível mais... subcutâneo, por assim dizer. O meu encontro com essa espécie de música me deixou mais afastado do pessimismo dramático normalmente reinante em minha cabeça. Esse distanciamento me faz sentir tão aliviado que mal posso descrever o quanto.
O mais interessante é que pude ver como uma idéia musical pode ser valiosa, não para fins terapêuticos ou para diversão pura e simples mas no campo intelectual. Esse tipo de percepção nem sempre me acompanhou, especialmente quando a música me falava muito prontamente de emoções que eu, por meu lado, já estava predisposto a abrigar.
O último ponto que me falta percorrer nesse pequeno e irregular itinerário mental é certamente dizer que essas músicas que tanto me agradaram não tratam de amor, como Blue in Green ou Kathy's Song. E isso não me faz a menor falta. Sempre me considerei a cima de tudo um romântico e agora me descubro envolvido pelos prazeres de algo novo. Talvez seja por causa de Time Out que eu já não esteja mais clamando aos céus por algum novo insight sobre a mente feminina. Espero que dure um pouco antes que eu volte a ouvir aquelas canções tristes outra vez. Até lá é relaxar e aproveitar o passeio.
P.S. Eventualmente escrevo algo sobre Rodrigo também. Afinal ele é um dos mais emblemáticos representantes do que aconteceu de bom no século vinte.
terça-feira, novembro 23, 2004
sexta-feira, novembro 19, 2004
Porque escrevo
Nada realmente bom me ocorreu para falar durante algum tempo, por isso nada escrevi. É bem verdade que se não tiver nada para dizer, uma pessoa deveria mesmo ficar quieta. Muito embora não tenha sempre seguido essa máxima um pouco batida e gasta pelo uso, tenho plena convicção de que ela terá me valido algumas vezes no fim das contas. Mas antes de fazer a matemática da vida que mal comecei, tenho algo para falar sobre o que estou fazendo justamente agora.
Estou aqui de novo. E isso acontece por um motivo (tudo, aliás, acontece por um motivo, já dizia o filósofo, e eu não poderia escapar a esse princípio). O fato novo é um estranho senso de responsabilidade que me tomou de assalto nesses últimos dias. Não imaginei que pudesse acontecer, mas a atividade de escrever simplesmente deixou de ser uma questão de mera opção (embora não o faça sem um certo prazer parte das vezes). A necessidade de escrever não me aflige como um vício, do modo que já ouvi falar que acontece com muitos escritores. Creio que isso se deva à circunstância de que não sou escritor, não sofro angústias em relação ao ofício e nem gozo das prerrogativas da função. Preciso escrever porque sinto que, de alguma forma estou obrigado a colocar pensamentos no papel e ponto final.
O problema de meu raciocínio é que obrigação, “ob ligatio”, ligado a, pressupõe que minha responsabilidade se dê em relação a alguém. A idéia é estar ligado a outra pessoa. Daí vem a pergunta: ligado a quem? Nunca fui buscar fora de mim razão para escrever, não creio que houvesse mesmo motivo além do fato de que era um bom exercício de higiene mental. Agora é uma responsabilidade. Saindo do âmbito do puramente pessoal para algo além do meu controle, que é externo a mim mas não está nos outros. Estou, no mínimo, confuso. E com razão. Continuo, no entanto tentando esclarecer-me.
Quando comecei, falava de responsabilidade e depois de obrigação, mas se não há outro sujeito na relação não poderia se tratar de nada disso. Sinto então que parece ser simplesmente natural estar escrevendo. Seria como se estivesse traindo a ordem das coisas caso me negasse a escrever. Todavia me parece pretensão demais imaginar que o que faço tem algo a ver com a ordem do universo. Tal atividade pode ter muito mais a ver com o mundo ordinário e desprovido de interesse que habitamos e ao qual nos acostumamos. É justamente à medida que nos acostumamos com o mundo que se torna mais necessário que uma pessoa escreva sobre ele. É importante que alguém faça recortes que destaquem os aspectos interessantes das coisas comuns, das vidas dos homens, do que se passa na cabeça deles, do que pode ser interessante no mundo.
Mas também não é o que faço. Até agora só tenho feito falar do que acontece comigo. Já considero esse tanto bastante trabalho, mas não vejo como a minha opinião a meu próprio respeito possa servir a qualquer outra pessoa. Então o que explica minha estranha obrigação que não é obrigação, necessidade que não é necessidade, utilidade inútil, fundamento último do que escrevo?
Não tenho esperança de encontrar resposta. Na dúvida sigo minha primeira diretriz: quando houver algo para dizer, digo. Caso contrário, vou sair a procurar assunto. Na falta de explicação é melhor continuar escrevendo e esperar que a resposta me pegue preparado para tomar nota e finalmente entender por que escrevo.
Estou aqui de novo. E isso acontece por um motivo (tudo, aliás, acontece por um motivo, já dizia o filósofo, e eu não poderia escapar a esse princípio). O fato novo é um estranho senso de responsabilidade que me tomou de assalto nesses últimos dias. Não imaginei que pudesse acontecer, mas a atividade de escrever simplesmente deixou de ser uma questão de mera opção (embora não o faça sem um certo prazer parte das vezes). A necessidade de escrever não me aflige como um vício, do modo que já ouvi falar que acontece com muitos escritores. Creio que isso se deva à circunstância de que não sou escritor, não sofro angústias em relação ao ofício e nem gozo das prerrogativas da função. Preciso escrever porque sinto que, de alguma forma estou obrigado a colocar pensamentos no papel e ponto final.
O problema de meu raciocínio é que obrigação, “ob ligatio”, ligado a, pressupõe que minha responsabilidade se dê em relação a alguém. A idéia é estar ligado a outra pessoa. Daí vem a pergunta: ligado a quem? Nunca fui buscar fora de mim razão para escrever, não creio que houvesse mesmo motivo além do fato de que era um bom exercício de higiene mental. Agora é uma responsabilidade. Saindo do âmbito do puramente pessoal para algo além do meu controle, que é externo a mim mas não está nos outros. Estou, no mínimo, confuso. E com razão. Continuo, no entanto tentando esclarecer-me.
Quando comecei, falava de responsabilidade e depois de obrigação, mas se não há outro sujeito na relação não poderia se tratar de nada disso. Sinto então que parece ser simplesmente natural estar escrevendo. Seria como se estivesse traindo a ordem das coisas caso me negasse a escrever. Todavia me parece pretensão demais imaginar que o que faço tem algo a ver com a ordem do universo. Tal atividade pode ter muito mais a ver com o mundo ordinário e desprovido de interesse que habitamos e ao qual nos acostumamos. É justamente à medida que nos acostumamos com o mundo que se torna mais necessário que uma pessoa escreva sobre ele. É importante que alguém faça recortes que destaquem os aspectos interessantes das coisas comuns, das vidas dos homens, do que se passa na cabeça deles, do que pode ser interessante no mundo.
Mas também não é o que faço. Até agora só tenho feito falar do que acontece comigo. Já considero esse tanto bastante trabalho, mas não vejo como a minha opinião a meu próprio respeito possa servir a qualquer outra pessoa. Então o que explica minha estranha obrigação que não é obrigação, necessidade que não é necessidade, utilidade inútil, fundamento último do que escrevo?
Não tenho esperança de encontrar resposta. Na dúvida sigo minha primeira diretriz: quando houver algo para dizer, digo. Caso contrário, vou sair a procurar assunto. Na falta de explicação é melhor continuar escrevendo e esperar que a resposta me pegue preparado para tomar nota e finalmente entender por que escrevo.
sábado, novembro 13, 2004
Longe de casa..
Bem, o título auto explicativo do post evidencia o fato de que estou longe de minha base usual no misterioso interior paulista, terra de violeiros, rodeios, alta tecnologia e produção cultural efervescente. Me encontro na vizinha Paulínia, conhecida por sua notória indústria petroquímica e pela desconcertante política local.
Por aqui privo da companhia de amigos bastante queridos e estou sendo bem alimentado. Assim não vou escrever reclamando de nada. Meramente registro minha passagem por essas bandas de cá para preencher o tempo escasso com algo diverso do trabalho que deveria estar desenvolvendo. Esse antigo costume está com jeito de que vai perdurar por anos a fio, aliás. Nada tão grave. Meu futuro repousa sobre uma sólida fundação de sonhos e puro ar. Não, isso não me preocupa, meramente me anima a ser cada vez mais autenticamente eu.
Estou longe de casa. Não tão longe, mas qualquer distância é uma boa desculpa para falar de casa. Mas não me surpreenderia se um dia fosse embora de lá. Minha casa está onde estiver meu coração, e ele é mais inconstante do que eu gostaria que fosse. Sinto falta da minha velha vida, mas se não posso tê-la de volta não há porque manter o quintal, o pé de jaboticaba, o sol caindo na tardinha, o canto dos pássaros. Só preciso da memória, ela vai me bastar, ela vai ter que bastar.
Acho que nunca amei ninguém tanto quanto amei as lembranças. Espero que me sirvam de algo essas lembranças que amo. Se não servirem pra mais nada, espero que as esqueça. Aí quem sabe eu possa até amar alguém. Por enquanto sigo apaixonado pela criança que não fui mas a que acho que fui, com toda a minha gravidade no olhar já perdida e minha honestidade incondicional paulatinamente sufocada pela necessidade de mentir e de enganar. Especialmente de mentir para mim. Sou um traidor.
Se sou um traidor, não há por que continuar em casa, maculando o ambiente das lembranças que amo e das tardes pelas quais suspiro ainda hoje. Assim devo sair de casa para um lugar mais condizente com minha condição de rebelde expulso do céu. Mas nunca ouvi falar de anjo algum que tenha ido para o exílio de livre e espontânea vontade. Tudo bem, nunca fui anjo, só caído de meu infantil estado de graça.
Acho que nunca estive tão longe de casa..
Por aqui privo da companhia de amigos bastante queridos e estou sendo bem alimentado. Assim não vou escrever reclamando de nada. Meramente registro minha passagem por essas bandas de cá para preencher o tempo escasso com algo diverso do trabalho que deveria estar desenvolvendo. Esse antigo costume está com jeito de que vai perdurar por anos a fio, aliás. Nada tão grave. Meu futuro repousa sobre uma sólida fundação de sonhos e puro ar. Não, isso não me preocupa, meramente me anima a ser cada vez mais autenticamente eu.
Estou longe de casa. Não tão longe, mas qualquer distância é uma boa desculpa para falar de casa. Mas não me surpreenderia se um dia fosse embora de lá. Minha casa está onde estiver meu coração, e ele é mais inconstante do que eu gostaria que fosse. Sinto falta da minha velha vida, mas se não posso tê-la de volta não há porque manter o quintal, o pé de jaboticaba, o sol caindo na tardinha, o canto dos pássaros. Só preciso da memória, ela vai me bastar, ela vai ter que bastar.
Acho que nunca amei ninguém tanto quanto amei as lembranças. Espero que me sirvam de algo essas lembranças que amo. Se não servirem pra mais nada, espero que as esqueça. Aí quem sabe eu possa até amar alguém. Por enquanto sigo apaixonado pela criança que não fui mas a que acho que fui, com toda a minha gravidade no olhar já perdida e minha honestidade incondicional paulatinamente sufocada pela necessidade de mentir e de enganar. Especialmente de mentir para mim. Sou um traidor.
Se sou um traidor, não há por que continuar em casa, maculando o ambiente das lembranças que amo e das tardes pelas quais suspiro ainda hoje. Assim devo sair de casa para um lugar mais condizente com minha condição de rebelde expulso do céu. Mas nunca ouvi falar de anjo algum que tenha ido para o exílio de livre e espontânea vontade. Tudo bem, nunca fui anjo, só caído de meu infantil estado de graça.
Acho que nunca estive tão longe de casa..
sexta-feira, novembro 12, 2004
Desculpas.
Meu último post foi sobre política. Não havia dado muita atenção ao fato quando escrevi mas agora percebo que foi um erro tê-lo publicado neste espaço. Aqui nesse blog eu não deveria falar de coisas que, por mais que me interessem, não deixam de ser (embora Platão talvez pudesse discordar) essencialmente mundanas, tendo pouco a ver com arte ou com filosofia. Esse é o espaço no qual, agora posso dizer seguramente, sem prejuízo de futura reconsideração, derramo meu lirismo, onde grito minha indignação contra minha própria forma de ser e desafio os limites que me são impostos por minha própria ignorância, minha canhestra escrita e minha lacunosa sensibilidade.
Pretendo um dia ser lido, até mesmo nessas "páginas", por mais que sejam pura experimentação, tatear pueril na atividade de escrever. É importante que seja então fiel a meu propósito. Eu odiaria se percebesse que em algum momento fiz alguma obra, manifestação artística ou expressão de pensamento filosófico, qualquer que fosse, políticamente engajada.
A política debatida pela arte tem o péssimo e inevitável vício de estar afastada da análise racional dos argumentos pela retórica emocional e muitas vezes escondida que é inerente à obra de arte. Por causa justamente de minhas convicções políticas (que são poucas e bem gerais diretrizes ou princípios) não poderia produzir arte com a finalidade de tomar esse ou aquele partido, defender esse ou aquele ideal. Seria o suficiente para me tornar incapaz de formular qualquer prescrição política séria e eu perderia minha credencial moral para falar sobre o assunto.
A política, quando orientadora da filosofia compromete o pensamento filosófico rigoroso, capaz de auto-crítica e submete o pensamento a projetos que, por sua natureza, são estranhos à filosofia. A postura filosófica engajada políticamente se torna um peso, aleija o pensamento filosófico, colocando o num ponto fixo estabelecido pela ideologia política. Não afirmo que a filosofia não deva dialogar com o mundo, penso justamente o contrário, mas o diálogo deve se dar no sentido de que a filosofia deve prover o indivíduo das ferramentas que lhe permitam analisar o mundo com alguma (esperançosamente maior) precisão. Isso jamais vai acontecer se a própria filosofia for formulada com vistas a um determinado intento transformador do mundo. Me parece que a atividade filosófica fornece perspectivas diferentes sobre o mundo, a transforação do seu nada modesto objeto de forma intencional e orientada é tarefa completamente externa a ela.
Seria perigoso demais esperar da filosofia fornecer respostas para escolhas que deveriam ser feitas em outras esferas. A descrição do mundo, a compreensão deste e do homem, a busca pelo conhecimento da verdade, essas são realidades apropriadas para a investigação filosófica, não a prescrição de um "modus vivendi" seja para uma única pessoa, seja para uma nação.
Na verdade, se a filosofia possui impacto político, importaria que se devesse sempre a um aumento na capacidade de compreensão do mundo que ela proporcionasse, jamais por que fizesse prescrições ideológicas de qualquer teor. O fato de que isso não acontece hoje é algo que os filósofos atuais tem a responder perante seus alunos, seus leitores e seus concidadãos.
Essas são boas razões para evitar desde cedo misturar o espaço dos escritos literários e filosóficos dos escritos puramente políticos. Essa restrição, como pode parecer à primeira vista, é justamente o que me permite exercer esses três lados de minha atividade intelectual com liberdade. Seria uma pena me ver preso por amarras auto impostas em qualquer dos campos: arte, política, pensamento filosófico. Sem liberdade de fato é impossível produzir qualquer coisa realmente autêntica em qualquer das áreas.
Peço desculpas, em vista das razões aduzidas, se não a mais ninguém, a mim mesmo.
Pretendo um dia ser lido, até mesmo nessas "páginas", por mais que sejam pura experimentação, tatear pueril na atividade de escrever. É importante que seja então fiel a meu propósito. Eu odiaria se percebesse que em algum momento fiz alguma obra, manifestação artística ou expressão de pensamento filosófico, qualquer que fosse, políticamente engajada.
A política debatida pela arte tem o péssimo e inevitável vício de estar afastada da análise racional dos argumentos pela retórica emocional e muitas vezes escondida que é inerente à obra de arte. Por causa justamente de minhas convicções políticas (que são poucas e bem gerais diretrizes ou princípios) não poderia produzir arte com a finalidade de tomar esse ou aquele partido, defender esse ou aquele ideal. Seria o suficiente para me tornar incapaz de formular qualquer prescrição política séria e eu perderia minha credencial moral para falar sobre o assunto.
A política, quando orientadora da filosofia compromete o pensamento filosófico rigoroso, capaz de auto-crítica e submete o pensamento a projetos que, por sua natureza, são estranhos à filosofia. A postura filosófica engajada políticamente se torna um peso, aleija o pensamento filosófico, colocando o num ponto fixo estabelecido pela ideologia política. Não afirmo que a filosofia não deva dialogar com o mundo, penso justamente o contrário, mas o diálogo deve se dar no sentido de que a filosofia deve prover o indivíduo das ferramentas que lhe permitam analisar o mundo com alguma (esperançosamente maior) precisão. Isso jamais vai acontecer se a própria filosofia for formulada com vistas a um determinado intento transformador do mundo. Me parece que a atividade filosófica fornece perspectivas diferentes sobre o mundo, a transforação do seu nada modesto objeto de forma intencional e orientada é tarefa completamente externa a ela.
Seria perigoso demais esperar da filosofia fornecer respostas para escolhas que deveriam ser feitas em outras esferas. A descrição do mundo, a compreensão deste e do homem, a busca pelo conhecimento da verdade, essas são realidades apropriadas para a investigação filosófica, não a prescrição de um "modus vivendi" seja para uma única pessoa, seja para uma nação.
Na verdade, se a filosofia possui impacto político, importaria que se devesse sempre a um aumento na capacidade de compreensão do mundo que ela proporcionasse, jamais por que fizesse prescrições ideológicas de qualquer teor. O fato de que isso não acontece hoje é algo que os filósofos atuais tem a responder perante seus alunos, seus leitores e seus concidadãos.
Essas são boas razões para evitar desde cedo misturar o espaço dos escritos literários e filosóficos dos escritos puramente políticos. Essa restrição, como pode parecer à primeira vista, é justamente o que me permite exercer esses três lados de minha atividade intelectual com liberdade. Seria uma pena me ver preso por amarras auto impostas em qualquer dos campos: arte, política, pensamento filosófico. Sem liberdade de fato é impossível produzir qualquer coisa realmente autêntica em qualquer das áreas.
Peço desculpas, em vista das razões aduzidas, se não a mais ninguém, a mim mesmo.
segunda-feira, novembro 08, 2004
Invasão política...
Esse blog foi criado para atender mal e mal minhas pretenções literárias mas o negócio é que recebi por e-mail um link para um projeto de lei que está tramitando na câmara e não pude deixar de dar um palpite. É que me impressiona ver a atividade do PT no legislativo. Um partido que põe um imbecil como esse Nazareno Fonteles no congresso simplesmente não merece o meu respeito. O link para o projeto é esse aqui: http://www.camara.gov.br/Sileg/Prop_Detalhe.asp?id=156281
Eu fico me perguntando o que o Partido dos Trabalhadores pretende como projeto político para o país: se é essa política econômica ultra ortodoxa e sacrificadora da produção e da classe média ou se é esse tipo de arroubo comunista desvairado que esse sujeito colocou no congresso para discussão.
Quem, em sã consciência, num país capitalista como o nosso deveria se pretender ser, propõe sacrificar o consumo dos únicos que realmente podem consumir obrigando essas pessoas a colocar seu dinheiro numa poupança para ser usada pelo governo federal para os mais diversos fins sociais e ecológicos (meu Deus do céu, quer salvar o meio ambiente, tire os favelados e afins de cima dos mananciais...). Agora, nem passa pela cabeça desse sujeito que a nossa frágil economia não vai achar nada saudável uma queda significativa de consumo (pois vai limitar o consumo justamente de quem pode consumir) para sustentar um ou vários programas do governo que inváriavelmente vão encher o bolso de burocratas, inchar mais ainda a máquina estatal e criar mais empregos para o PT, partido da situação, e não tenho medo de arriscar o palpite de que serão cargos de confiança.
Taxar o consumo para acabar com a inflação e colocar o dinheiro na mão do governo nunca resolveu nada. O Brasil tem um enorme mercado interno potencial e tudo o que precisa é de uma política de disponibilização de dinheiro barato no mercado para aumentar a produção e a geração de emprego. Alguém questiona que haveria muito mais redução de preços se houvesse menos interferência do estado na economia através do sistema tributário combinado com maior e mais livre concorrência? Isso já está provado! O governo cria mais impostos ou os aumenta e depois vem aumentar os juros para segurar os preços na economia e evitar a inflação. Quer segurar os preços? Que tal aumentar a produção pela disponibilização de capital barato e aumentar, por tabela, o nível de emprego do país (que por sinal é o verdadeiro problema a ser atacado no presente momento).
Aliás, um parêntesis, a única coisa boa que vem da desgraça nacional do desemprego é que estão desarmando essa máfia sindicalista de poder de negociação, mas nem isso tem dado certo porque eles estão agora confortávelmente aninhados nas tetas do governo federal...
Formidável o exemplo dos bolsa miséria do governo. O Lula mal chega ao poder, se auto intitula pai dos pobres, como qualquer bom populista, e enfia quase sete bilhões num ministério "ad hoc" que ao invés de acabar com a miséria vai encher o bolso de familiares dos prefeitos de cidadezinhas por aí a fora. Agora querem taxar, além da produção o consumo. Esse deputado lunático merece mesmo uma medalha pela coragem de mostrar tamanho despropósito em público.
É, a esquerdinha, além de incoerente, não tem a menor noção do que significa governar a sério. Os eleitores são ignorantes crônicos guiados por intelectuais cegos pela ideologia marxista mal copiada dos europeus. Somos uma nação de babuínos mesmo. Nesse passo vamos ficar como eles: nus, uns apontando para os rabos dos outros e achando terrívelmente engraçado...
Eu fico me perguntando o que o Partido dos Trabalhadores pretende como projeto político para o país: se é essa política econômica ultra ortodoxa e sacrificadora da produção e da classe média ou se é esse tipo de arroubo comunista desvairado que esse sujeito colocou no congresso para discussão.
Quem, em sã consciência, num país capitalista como o nosso deveria se pretender ser, propõe sacrificar o consumo dos únicos que realmente podem consumir obrigando essas pessoas a colocar seu dinheiro numa poupança para ser usada pelo governo federal para os mais diversos fins sociais e ecológicos (meu Deus do céu, quer salvar o meio ambiente, tire os favelados e afins de cima dos mananciais...). Agora, nem passa pela cabeça desse sujeito que a nossa frágil economia não vai achar nada saudável uma queda significativa de consumo (pois vai limitar o consumo justamente de quem pode consumir) para sustentar um ou vários programas do governo que inváriavelmente vão encher o bolso de burocratas, inchar mais ainda a máquina estatal e criar mais empregos para o PT, partido da situação, e não tenho medo de arriscar o palpite de que serão cargos de confiança.
Taxar o consumo para acabar com a inflação e colocar o dinheiro na mão do governo nunca resolveu nada. O Brasil tem um enorme mercado interno potencial e tudo o que precisa é de uma política de disponibilização de dinheiro barato no mercado para aumentar a produção e a geração de emprego. Alguém questiona que haveria muito mais redução de preços se houvesse menos interferência do estado na economia através do sistema tributário combinado com maior e mais livre concorrência? Isso já está provado! O governo cria mais impostos ou os aumenta e depois vem aumentar os juros para segurar os preços na economia e evitar a inflação. Quer segurar os preços? Que tal aumentar a produção pela disponibilização de capital barato e aumentar, por tabela, o nível de emprego do país (que por sinal é o verdadeiro problema a ser atacado no presente momento).
Aliás, um parêntesis, a única coisa boa que vem da desgraça nacional do desemprego é que estão desarmando essa máfia sindicalista de poder de negociação, mas nem isso tem dado certo porque eles estão agora confortávelmente aninhados nas tetas do governo federal...
Formidável o exemplo dos bolsa miséria do governo. O Lula mal chega ao poder, se auto intitula pai dos pobres, como qualquer bom populista, e enfia quase sete bilhões num ministério "ad hoc" que ao invés de acabar com a miséria vai encher o bolso de familiares dos prefeitos de cidadezinhas por aí a fora. Agora querem taxar, além da produção o consumo. Esse deputado lunático merece mesmo uma medalha pela coragem de mostrar tamanho despropósito em público.
É, a esquerdinha, além de incoerente, não tem a menor noção do que significa governar a sério. Os eleitores são ignorantes crônicos guiados por intelectuais cegos pela ideologia marxista mal copiada dos europeus. Somos uma nação de babuínos mesmo. Nesse passo vamos ficar como eles: nus, uns apontando para os rabos dos outros e achando terrívelmente engraçado...
Soneto
Esse soneto é de 25 de janeiro de 2003. Eu costumava escrever muitos sonetos assim desde o colégio até aquela época. Depois parei.
Sinto que nada mais na despedida
É mais cruel que o beijo dos amantes
Seus lábios tristes, suas mãos errantes
Seus corações pequenos, já sem vida
Sinto que a vida já não vale nada
Quando é findo o amor em seus semblantes
E se passa a esperar o quanto antes
Não mais ver a pessoa tão amada
Sinto que a angústia dói na própria carne
Temo que a redenção esteja longe
Vejo que o coração ainda está triste
Apartado de todo amor que existe
Apartada da mão que a protege
Vão se os amantes num pesar perene.
Sinto que nada mais na despedida
É mais cruel que o beijo dos amantes
Seus lábios tristes, suas mãos errantes
Seus corações pequenos, já sem vida
Sinto que a vida já não vale nada
Quando é findo o amor em seus semblantes
E se passa a esperar o quanto antes
Não mais ver a pessoa tão amada
Sinto que a angústia dói na própria carne
Temo que a redenção esteja longe
Vejo que o coração ainda está triste
Apartado de todo amor que existe
Apartada da mão que a protege
Vão se os amantes num pesar perene.
sexta-feira, novembro 05, 2004
Chanson d’Automne
Achei que seria bom publicar alguma coisa de poesia alheia para quebrar um pouco a gravidade do último tema tratado. Sinceramente entendo pouco do sentido, mas o fantástico nesse poema é o ritmo e a sonoridade quando lido. Belíssima canção de outono. Sem dúvida.
Chanson d’Automne
Paul Verlaine (1844–†1896)
LES sanglots longs
Des violons
De l’automne
Blessent mon cœur
D’une langueur
Monotone.
Tout suffocant
Et blême, quand
Sonne l’heure,
Je me souviens
Des jours anciens
Et je pleure;
Et je m’en vais
Au vent mauvais
Qui m’emporte
Deçà, delà,
Pareil à la
Feuille morte.
Chanson d’Automne
Paul Verlaine (1844–†1896)
LES sanglots longs
Des violons
De l’automne
Blessent mon cœur
D’une langueur
Monotone.
Tout suffocant
Et blême, quand
Sonne l’heure,
Je me souviens
Des jours anciens
Et je pleure;
Et je m’en vais
Au vent mauvais
Qui m’emporte
Deçà, delà,
Pareil à la
Feuille morte.
Esse texto está datado porque foi escrito anteontem e o original estará em breve perdido entre meus papéis, todos manuscritos dispersos em algum canto da casa.
O que é possível dizer da experiência personalíssima do homem com Deus? Será que alguém hoje seria capaz de formular, como fizeram os homens de tempos atrás, o que vem a ser conhecer a Deus, ao menos o quanto sabem a respeito do que seja esse conhecimento?
Sem dialogar com Deus, sem reconhecer assim sua presença, o homem é um ser absolutamente sozinho. Gosto da idéia medieval de que só é possível conhecermos mediante o intelecto divino e a parte de sua essência em nós. É uma idéia que nos leva a supor a presença e atuação de Deus a cada instante e em todos os lugares.
Já faz tempo que não freqüento os espaços da casa de Deus. Talvez porque não sentisse que houvesse alguém ali que considerasse a experiência religiosa com a mesma gravidade que eu. Talvez aquelas pessoas simplesmente não compartilhassem meu pessimismo solitário.
Agora percebo que, pela primeira vez em muito tempo, penso em Deus ao invés de pensar em sexo. Nunca me senti tão sozinho quanto agora. Costumava falar com Ele reverente e despreocupadamente, todos os dias, ou ao menos quantos dias posso recordar, mas agora estou muito sozinho e escrevo sobre Deus. O afastamento a que cheguei para estar fazendo isso é sintoma do quanto estou caído numa existência cada vez mais mundana. É muito sério ter uma convicção firme de que Deus existe e que se está afastado d’Ele. Na verdade é terrível. A própria vida perece escapar por entre os dedos. Eu desespero. Quando não me sujeito à vontade de Deus, fico sujeito à minha vontade, a qual é cega, sem propósito e jamais poderá ser satisfeita. Me dói pensar que tenha sido louco a ponto de acreditar que a tirania da vontade pudesse apresentar alguma liberdade.
A prisão dessa vontade tirana pode também ser entendida como um exílio. Ficamos obrigados por ela a ir para qualquer lugar, menos aquele mais querido. Nesse sentido, buscar a Deus é como empreender uma jornada de volta para casa. Estar em Deus é como estar em um lugar familiar no qual fomos amados e nutridos. Estar no exílio é estar na solidão, privado da ligação que era a única prova de que há algo além de nós mesmos no mundo. Daí o nome religião: re ligio, re-ligação.
Essa esperança de religação, essa esperança que temos de abandonar o mundo de ilusão e voltar para casa é o que faz a vida tão preciosa. É a negação da nossa vontade, da nossa dor, de todo o mal sobre o qual sempre escrevi e todo o que mais existe.
Campinas, 03 de novembro de 2004
O que é possível dizer da experiência personalíssima do homem com Deus? Será que alguém hoje seria capaz de formular, como fizeram os homens de tempos atrás, o que vem a ser conhecer a Deus, ao menos o quanto sabem a respeito do que seja esse conhecimento?
Sem dialogar com Deus, sem reconhecer assim sua presença, o homem é um ser absolutamente sozinho. Gosto da idéia medieval de que só é possível conhecermos mediante o intelecto divino e a parte de sua essência em nós. É uma idéia que nos leva a supor a presença e atuação de Deus a cada instante e em todos os lugares.
Já faz tempo que não freqüento os espaços da casa de Deus. Talvez porque não sentisse que houvesse alguém ali que considerasse a experiência religiosa com a mesma gravidade que eu. Talvez aquelas pessoas simplesmente não compartilhassem meu pessimismo solitário.
Agora percebo que, pela primeira vez em muito tempo, penso em Deus ao invés de pensar em sexo. Nunca me senti tão sozinho quanto agora. Costumava falar com Ele reverente e despreocupadamente, todos os dias, ou ao menos quantos dias posso recordar, mas agora estou muito sozinho e escrevo sobre Deus. O afastamento a que cheguei para estar fazendo isso é sintoma do quanto estou caído numa existência cada vez mais mundana. É muito sério ter uma convicção firme de que Deus existe e que se está afastado d’Ele. Na verdade é terrível. A própria vida perece escapar por entre os dedos. Eu desespero. Quando não me sujeito à vontade de Deus, fico sujeito à minha vontade, a qual é cega, sem propósito e jamais poderá ser satisfeita. Me dói pensar que tenha sido louco a ponto de acreditar que a tirania da vontade pudesse apresentar alguma liberdade.
A prisão dessa vontade tirana pode também ser entendida como um exílio. Ficamos obrigados por ela a ir para qualquer lugar, menos aquele mais querido. Nesse sentido, buscar a Deus é como empreender uma jornada de volta para casa. Estar em Deus é como estar em um lugar familiar no qual fomos amados e nutridos. Estar no exílio é estar na solidão, privado da ligação que era a única prova de que há algo além de nós mesmos no mundo. Daí o nome religião: re ligio, re-ligação.
Essa esperança de religação, essa esperança que temos de abandonar o mundo de ilusão e voltar para casa é o que faz a vida tão preciosa. É a negação da nossa vontade, da nossa dor, de todo o mal sobre o qual sempre escrevi e todo o que mais existe.
Campinas, 03 de novembro de 2004
segunda-feira, novembro 01, 2004
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