sexta-feira, novembro 12, 2004

Desculpas.

Meu último post foi sobre política. Não havia dado muita atenção ao fato quando escrevi mas agora percebo que foi um erro tê-lo publicado neste espaço. Aqui nesse blog eu não deveria falar de coisas que, por mais que me interessem, não deixam de ser (embora Platão talvez pudesse discordar) essencialmente mundanas, tendo pouco a ver com arte ou com filosofia. Esse é o espaço no qual, agora posso dizer seguramente, sem prejuízo de futura reconsideração, derramo meu lirismo, onde grito minha indignação contra minha própria forma de ser e desafio os limites que me são impostos por minha própria ignorância, minha canhestra escrita e minha lacunosa sensibilidade.

Pretendo um dia ser lido, até mesmo nessas "páginas", por mais que sejam pura experimentação, tatear pueril na atividade de escrever. É importante que seja então fiel a meu propósito. Eu odiaria se percebesse que em algum momento fiz alguma obra, manifestação artística ou expressão de pensamento filosófico, qualquer que fosse, políticamente engajada.

A política debatida pela arte tem o péssimo e inevitável vício de estar afastada da análise racional dos argumentos pela retórica emocional e muitas vezes escondida que é inerente à obra de arte. Por causa justamente de minhas convicções políticas (que são poucas e bem gerais diretrizes ou princípios) não poderia produzir arte com a finalidade de tomar esse ou aquele partido, defender esse ou aquele ideal. Seria o suficiente para me tornar incapaz de formular qualquer prescrição política séria e eu perderia minha credencial moral para falar sobre o assunto.

A política, quando orientadora da filosofia compromete o pensamento filosófico rigoroso, capaz de auto-crítica e submete o pensamento a projetos que, por sua natureza, são estranhos à filosofia. A postura filosófica engajada políticamente se torna um peso, aleija o pensamento filosófico, colocando o num ponto fixo estabelecido pela ideologia política. Não afirmo que a filosofia não deva dialogar com o mundo, penso justamente o contrário, mas o diálogo deve se dar no sentido de que a filosofia deve prover o indivíduo das ferramentas que lhe permitam analisar o mundo com alguma (esperançosamente maior) precisão. Isso jamais vai acontecer se a própria filosofia for formulada com vistas a um determinado intento transformador do mundo. Me parece que a atividade filosófica fornece perspectivas diferentes sobre o mundo, a transforação do seu nada modesto objeto de forma intencional e orientada é tarefa completamente externa a ela.

Seria perigoso demais esperar da filosofia fornecer respostas para escolhas que deveriam ser feitas em outras esferas. A descrição do mundo, a compreensão deste e do homem, a busca pelo conhecimento da verdade, essas são realidades apropriadas para a investigação filosófica, não a prescrição de um "modus vivendi" seja para uma única pessoa, seja para uma nação.

Na verdade, se a filosofia possui impacto político, importaria que se devesse sempre a um aumento na capacidade de compreensão do mundo que ela proporcionasse, jamais por que fizesse prescrições ideológicas de qualquer teor. O fato de que isso não acontece hoje é algo que os filósofos atuais tem a responder perante seus alunos, seus leitores e seus concidadãos.

Essas são boas razões para evitar desde cedo misturar o espaço dos escritos literários e filosóficos dos escritos puramente políticos. Essa restrição, como pode parecer à primeira vista, é justamente o que me permite exercer esses três lados de minha atividade intelectual com liberdade. Seria uma pena me ver preso por amarras auto impostas em qualquer dos campos: arte, política, pensamento filosófico. Sem liberdade de fato é impossível produzir qualquer coisa realmente autêntica em qualquer das áreas.

Peço desculpas, em vista das razões aduzidas, se não a mais ninguém, a mim mesmo.

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