quarta-feira, fevereiro 23, 2005

Feliz Aniversário

Engraçado como imaginei que fosse ficar tão afetado pela mudança do espaço físico no qual a minha vida se desenrola. Agora que mudou continuo muito mais preocupado com a passagem do tempo. É o sentido interno da passagem do tempo que me marca, deprime e limita. Mais um ano veio e, apesar das mudanças externas, só as que vem de dentro me afetam de fato. O meio no qual me insiro não parece me afetar tanto quanto a época na qual vivo. Minha circunstância é temporal. O resto, a despeito do que previa, importa pouco.

O texto abaixo foi escrito no dia 29 de novembro de 2004. Achei que seria melhor publicar antes que perdesse o papel. Lembro-me de tê-lo escrito à sombra de algumas daquelas árvores que ficam na frente do prédio da pós-graduação do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UNICAMP. A pesar de estar bastante tranqüilo no momento não acho que estava muito bem.

Olhando agora para o que escrevi vejo o quanto minhas reivindicações são vazias, vagas e diáfanas. Não tenho nem ao menos noção do que me incomoda, só gosto de ficar inventando um palavreado que me permita dar vazão a esse nada numa esfera relativamente segura. Foi bom ter feito aquele registro porquanto posso olhar para trás e perceber o quanto sou fraco, resmungão e destituído de conteúdo. Seria de se esperar que depois de ler tanto eu pudesse ter me aplicado, mesmo que incidentalmente, a pensar além da minha própria infelicidade oca. Não fui capaz. Não sou capaz. Sou incapaz. Ora, não sei de nada, nunca soube, gostava de pensar que seria melhor crescer, mas na, não é. Eu era um moleque feio, educado, relativamente inteligente para alguém da minha idade. Hoje sou mais um pretenso adulto à deriva no mundo porque não quis se expor à vida. Hoje posso rir de mim mesmo, isso tudo é um bocado patético.

Honestamente espero que minha auto-piedade não me sufoque um dia desses. Hoje acho que quero viver sim, apesar de tudo que possa sobrevir, da insatisfação e da solidão. Mas conto com a esperança de sobreviver, o que é mais do que contava ter algumas semanas atrás. O futuro dirá se tive razão (se bem que nesse caso não importará ter estado errado no final). Mas chega de bobagens, vamos ao ponto.


Feliz aniversário.


Agora é oficial. Acabo de completar vinte e um anos de descontentamento com a minha vida em quase todos os âmbitos. Fora minha vida familiar relativamente livre de conturbações estou na mesma; confuso, a vinte e um anos perturbado pela circunstância de minha vida. Vinte e um anos perdido, sem a menor idéia do que pensar sobre o mundo, sobre as pessoas, sobre a política, sobre as mulheres, sobre os vícios e sobre as virtudes.

Talvez meu conhecimento possa ser limitado em relação à quase tudo que não seja ligado aos meus próprios vícios. Não falo de beber e fumar, esses são os fáceis. Falo de vícios como a necessidade inescapável de pensar sobre tudo até o ponto da demência, da intolerância em relação à gente burra, da minha polidez hipócrita que me impede de dizer a uma pessoa o quanto ela é burra, de minha solidão auto-imposta por um traço de caráter, da minha vontade de contrariar o que é consenso, da minha incapacidade de me relacionar com uma mulher sem que eu a despreze ou ela me despreze, da minha inconstância no envolvimento com qualquer projeto a longo prazo, da minha aversão pelo trabalho, da maneira empolada e protocolar de falar, que me faz tão chato e tão único.

Acho que com vinte e um anos de convivência já me conheço bem o suficiente. O resto não me é dado saber. Não me lembro de quando me tornei tão pessimista em relação a mim mesmo. Acho que foi na infância, algum tipo de reação ao otimismo com o qual encaravam meu futuro. Nunca quis tanta responsabilidade como cumprir tamanhas expectativas, aliás, sempre quis ser um pouco mais irresponsável. E menos consciente de minhas limitações.

Agora, com vinte e um anos, essa carga de responsabilidade me conclama a superar os meus defeitos, justamente esses defeitos que constituem boa parte do que gosto em mim mesmo (vá lá que seja desse jeito doentio de desgostar gostando). Imagino o que seria de mim sem os meus vícios. Seria terrivelmente insuportável. Quais são meus objetivos imediatos, dado que, no fundo, aspiro a uma das vidas imperfeitas que me são possíveis. Qual delas farei chamar minha?

Outra coisa interessante é que diante desse quadro me vejo atraído por mulheres que compartilham dessas imperfeições, que são imperfeitas do mesmo modo que eu, quiçá dissolutas como eu... E qualquer uma que se importe comigo já não está imperfeita o bastante, não terá vícios suficientes para que juntos os façamos conviver, os meus e os dela. Sinto falta do tempo em que podia aspirar uma mulher ideal, um emprego ideal, uma vida ideal. Havia um propósito específico na minha existência de então. Agora tudo não passa de um impulso cego. Maldita a hora em que eu, ao invés de sonhar, escolhi viver. Sou um vivente imperfeito, não tenho coragem de explorar todas as conseqüências possíveis de minhas escolhas e atos e fico aqui escrevendo sobre a vida. Entre a luz e as sombras preferi a fresca penumbra. Viver assim requer muita habilidade, e requer toda a minha energia aceitar todos os paradoxos que minhas escolhas implicam.

O pior de tudo é que a vinte e um anos fico executando esse exercício inútil de choradeira, escrevo de minha própria estupidez, à procura de alguma redenção que nunca chegue.

terça-feira, fevereiro 15, 2005

Amores Perdidos

O amor é um jogo repleto de possibilidades, especialmente possibilidades perdidas. Olhar para trás e relembrar as frágeis construções do “que poderia ter sido” é uma disciplina profundamente reveladora do caráter. Aqueles em paz consigo mesmos são capazes de enxergar nas possibilidades perdidas um gentil sussurro de algo que não teria razão de ser, como um raio tímido de sol numa madrugada fria. Aqueles presos ao presente são incapazes de olhar para trás e compreender sequer que fizeram escolhas, deixaram possibilidades para trás, as quais moldaram suas vidas talvez mais do que as escolhas que fizeram. Aqueles presos ao passado ficam acordados à noite, imaginando mil decisões que os teriam feito felizes. Aqueles imersos em solidão contemplam o passado e o futuro indiferentemente, com uma resignação sombria diante de ambos.

Talvez a única coisa mais cortante do que o amor que sentimos seja o amor que perdemos. Quando o amor acontece, nosso senso de proporção é satisfeito: o homem é para a mulher e ela para ele. Quando se perde o amor, aquele pesar conformado que nos aflige, o suspiro profundo, a tristeza que nos abate, a dor que chora conosco, deixam tudo mais bonito. A beleza desse instante único em que percebemos a oportunidade perdida, o átimo de tempo em que em que o amor nos foge das mãos, é o que há de mais sublime e belo no tempo do coração. No fim, o que nos resta é o consolo de que onde morre o amor, nasce a beleza. Os corações sacrificados, os amores perdidos, as lágrimas contadas: a eles brindamos e bebemos ao chegar a noite.

segunda-feira, fevereiro 14, 2005

The angel of death watches over me.
She has a face, and a name,
and a voice.

The angel of death is a dancer,
and a graceful one.
So I follow her steps
as she calls.

I hear my name
and I feel no more,
and I see no more,
and I am no more.

I sacrifice my last, desperate breath
to call your name,
but you are away, in other arms
I love no more.

Meu peito era tristeza...

Meu peito era tristeza vaga,
dor indefinível,
solidão vadia.

Por te conhecer, meu bem
meu mal ganhou um nome,
um par de olhos claros,
um sorriso cálido,
um corpo de mulher.

Você queima e não mata,
fere mas não sangro;
me dá de beber, no corpo,
o fel que todo dia espero.

Por você me derramo,
em libação calada
de amor indigno.